É muito provável que você conheça alguém que já esteve – ou que está – em um relacionamento abusivo. Relações em que há agressões físicas, verbais ou psicológicas são, infelizmente, algo muito comum.
Apesar de o tema estar sendo mais amplamente discutido na mídia, e de aquele papo antigo de não “meter a colher” em briga de casal estar finalmente sendo deixado de lado, ainda é muito comum que se culpe a vítima pela situação. Afinal, pensam muitas pessoas, por que as mulheres ainda “deixam” que isso aconteça? Por que “submetem” a isso em vez de simplesmente irem embora?
Em um artigo publicado no site The Conversation, o professor e pesquisador Daniel G. Saunders, da Universidade de Michigan, fala sobre seus estudos a respeito desse assunto e traz alguma luz para que se entenda o que impede as mulheres de se livrarem de relacionamentos abusivos.
A resposta, como se pode imaginar, está ligada a uma série de fatores. Um dos mais comuns é a falta de recursos – a mulher talvez não tenha um emprego, ou não ganhe o suficiente para se sustentar sozinha. Se ela tiver filhos, a situação fica ainda mais complicada.
Outro motivo é a falta de apoio da família, amigos e colegas, que muitas vezes não acreditam ou até culpam a vítima pelo abuso; e há ainda o medo: afinal, as mulheres podem ter motivos reais para temer por sua vida caso deixem seu companheiro. Um estudo feito pelo próprio professor Saunders constatou que o risco de homicídio aumenta logo depois de a vítima deixar o abusador.
Mas há outras razões, menos visíveis, que mantêm a vítima presa a essa relação:
– o parceiro não é violento o tempo todo, mas também se mostra gentil e sensível;
– o parceiro se mostra arrependido e a vítima fica com pena;
– o parceiro diz que vai procurar tratamento e a vítima cria esperanças de que ele vá mudar;
– o parceiro menospreza a vítima e destrói a sua autoconfiança, o que faz com que ela se sinta presa a essa situação e tenha vergonha de pedir ajuda.
“Deixar o parceiro é frequentemente um processo complexo com vários estágios: minimizar o abuso e tentar ajudar o agressor; abrir os olhos ao fato de que o relacionamento é abusivo e perder a esperança de que vai melhorar; e, finalmente, focar nas próprias necessidades de segurança e sanidade e lutar para superar os obstáculos externos”, escreve o professor.
Quando o abusador é um homem de status ou alguém querido na comunidade, a vítima tem ainda outros dois fortes motivos para ficar relutante: por um lado, o medo de destruir a carreira do parceiro; de outro, o de não acreditarem em sua palavra.
Descrença pública
O medo da descrença de outras pessoas é bem fundamentado. “Em um estudo, o público via um ataque contra um parceiro íntimo como menos grave do que um ataque a um estranho, ainda que o mesmo nível de força fosse usado”, escreve Saunders.
“Embora a aceitação pública do abuso doméstico tenha diminuído com o tempo, a culpabilização das vítimas está ligada a pontos de vista machistas, como a crença de que a discriminação contra a mulher não é mais um problema e homens e mulheres têm oportunidades iguais”, completa.
Esse tipo de comportamento não está restrito a pessoas leigas: profissionais de saúde, terapeutas conjugais, juízes, policiais e outras autoridades que deveriam proteger as vítimas muitas vezes as ignoram, as desacreditam ou minimizam as agressões.
Para ajudar a combater esse tipo de erro, o professor sugere que se envolvam meninos e homens no combate à violência doméstica, educando-os sobre o assunto e incentivando um comportamento mais cuidadoso e respeitoso para com as mulheres.
E há ainda uma solução mais imediata: “É preciso pouco ou nenhum treinamento para que os profissionais, ou qualquer outra pessoa, deem crédito às experiências das vítimas e, assim, possam ajudá-las a cultivar a força interior para conseguir sair dessa relação”, escreve. Para isso, basta mostrar a essas mulheres que elas não estão sozinhas e que você acredita nelas. Isso já faz muita diferença.
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